quarta-feira, 25 de agosto de 2021

História do Anglicanismo

 

História do Anglicanismo

Em 1810 quando Jorge III era o rei do Reino Unido da Grã Bretanha e Irlanda, rei de Hanover e Duque de Brunsvique e Dom João VI, rei do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, eles assinaram o tratado de comércio e navegação entre Brasil e Inglaterra que no Artigo 12º do referido tratado dava garantias aos súditos de sua majestade de praticarem sua religião de origem no Brasil.

​Era Arcebispo de Cantuária Sua Graça Charles Manners – Sutton e começava em terras brasileiras a Fé Anglicana, sob a condição de que suas Igrejas e Capelas fossem construídas de tal modo que externamente assemelhasse a casa de habitação, para não serem confundidas com templos da Igreja Romana. O uso de sinos também não era permitido para a Igreja Anglicana anunciar publicamente as celebrações, além de não poder pregar ou declamar publicamente a fé, para não atrair fiéis da Igreja Romana, a religião oficial do país.

As celebrações Anglicanas aconteciam geralmente em navios ou nas casas particulares de famílias britânicas. Somente em 1873 quando Vitória era Rainha do Reino Unido e Irlanda e Sua Graça Archibald Campbell Tait era arcebispo da Cantuária, era construído e consagrado como Saint Paul’s Anglican Church, o primeiro Templo Anglicano em São Paulo, para atender a comunicada de britânica formada pelos funcionários da Railway, empresa britânica responsável pela construção das estradas de ferro e da Estação da Luz, dentre outras.

​Em 24 de novembro de 1963 é lançada a pedra fundamental para a construção de um novo templo, consagrado em 13 de maio de 1967, quando houve a mudança da Rua Couto de Magalhães, no centro, para o atual endereço no Alto da Boa Vista.

A transferência e a obra foram uma empreitada do grande batalhador britânico, o Reverendo Towsend, Reitor desta Paróquia de 1947 a 1970. Hoje a Catedral Anglicana de São Paulo é a cátedra da Diocese Anglicana no Brasil, que dá continuidade a divulgação do evangelho de acordo com a tradição anglicana, mas respeitando cada paróquia com sua forma de ser.

Juntamente com a Igreja Anglicana de Todos os Santos, na cidade de Santos (São Paulo), fundada em 1918 pelos britânicos residentes na cidade e pela missão dos marinheiros, ambas as igrejas são as únicas no Estado de São Paulo fundadas diretamente pelos ingleses e súditos de sua Majestade.

ANGLICANISMO - O início.

O cristianismo chegou à Inglaterra no século III. Nessa época o território estava sob um processo de colonização romana. Os legionários, mercadores, soldados e administradores levaram à colônia suas leis, costumes e religião. Entre eles havia provavelmente aqueles que tinham abraçado a fé cristã e oravam secretamente a Deus, enquanto os seus companheiros prestavam honras ao império, ao imperador e aos deuses das religiões de mistério. Estamos aqui no terreno das conjecturas.

A história não deixou documentos que pudessem provar a veracidade dos fatos. Por isso, nos lugares marcados pelo silêncio da história, encontramos lendas e tradições que falam de viagens missionárias que teriam sido feitas àquela ilha pelos apóstolos Paulo e Filipe e por José de Arimatéia. A primeira referência histórica sobre a existência de cristãos na Grã-Bretanha foi registrada por Tertuliano que, em 208, fala de regiões da ilha que haviam se convertido ao cristianismo. Pouco se sabe sobre esses cristãos durante o segundo século. O certo é que, em 314, três bispos ingleses participaram do Concílio de Arles, no sul da França. Esse fato mostra que já havia uma igreja organizada na grande ilha. No começo do século V, os romanos abandonaram a Grã-Bretanha, permitindo a invasão dos anglo-saxões, que destruíram as igrejas e reduziram a prática da fé cristã durante quase 150 anos. Em 597, o papa Gregório enviou uma comitiva de 40 monges, chefiada por Agostinho, para converter os bretões. A obra missionária iniciada por Agostinho foi consolidada por uma segunda missão romana liderada por Teodoro de Tarso.

No final do século X, os dinamarqueses invadiram a Grã-Bretanha e destruíram quase tudo, deixando a impressão que Deus havia se ausentado do mundo. Em 1016, houve uma segunda invasão normanda, mas com a diferença de que o rei era cristão e por isso a igreja foi protegida. Doze séculos depois, a igreja inglesa julgou necessário resistir à antiga intromissão papal, rompendo suas relações com Roma.

SINAIS DA REFORMA

Os primeiros sinais da reforma inglesa que vão eclodir na separação provocada por Henrique VIII, em 1534, começaram, na verdade, com Anselmo (1034-1109), que aceitou o convite para ser Arcebispo de Cantuária sob duas condições: que as propriedades da igreja fossem devolvidas pelo rei e que o arcebispo fosse reconhecido como conselheiro do rei em matéria religiosa. A luta que começou entre a coroa e a igreja confirmou, mais tarde, que a Inglaterra fez sua reforma religiosa debruçada sobre si mesma. Henrique VIII não fundou uma nova igreja, mas simplesmente separou a igreja que já existia na Inglaterra da tutela e controle romanos por razões políticas, econômicas, religiosas e até pessoais.

Durante quase mil anos a Igreja da Inglaterra esteve sob o domínio direto de Roma. Henrique VIII rompeu essa antiga filiação eclesiástica com o apoio do Parlamento. Separada e independente, a Igreja da Inglaterra continuou sua milenar caminhada na história, alternando períodos de influência ora romanístas, ora protestantes. Em 1559, começou o reinado de Isabel I, e com ela veio o controvertido Ato de Uniformidade, que devolveu à rainha o mesmo poder sobre a igreja que tinha Henrique VIII. A era elizabetana foi um período de apogeu. Foi nessa época que começou a colonização da América, onde a igreja anglicana se desenvolveu rapidamente e se organizou principalmente depois da independência americana em 1776. A igreja americana teve seu primeiro bispo em 1784 e manteve a igreja livre do poder civil. Assegurada a sucessão apostólica, a igreja americana se desenvolveu rapidamente, criando dioceses, paróquias e inúmeras instituições.

PRINCÍPIOS

As igrejas anglicanas defendem e proclamam a fé católica e apostólica nas Escrituras e interpretada à luz das tradições, do estudo e da razão. Em obediência aos ensinos de Jesus, as igrejas são comissionadas para proclamar as boas novas do Evangelho para toda a criação. A fé, a ordem e prática estão expressos no Livro de Oração Comum, nos ordinais dos séculos XVI e XVII e mais resumidamente no Quadrilátero de Lambeth, aprovado pela conferência de Lambeth de 1888. Este documento definiu como elementos essenciais de fé e ordem para a busca da unidade cristã:

1. Bíblia Sagrada – Acreditamos que as Sagradas Escrituras contêm toda revelação necessária para que a humanidade alcance vida plena. Toda nossa doutrina e liturgia sustentam-se na Bíblia Sagrada.

2. Os Credos Apostólicos e Niceno – Escritos no tempo da igreja indivisa, constituem a confissão normativa da fé católica que preservamos ainda hoje.

3. Os Sacramentos – A Igreja Anglicana é uma igreja sacramental. Professamos o Santo Batismo e a Santa Eucaristia como legítimos sacramentos diretamente ordenados por Cristo e instrumentos da graça salvífica de Deus. Há outros sacramentos menores, não ordenados por Jesus, mas reconhecidos pela igreja como tendo caráter sacramental. São eles: a Confirmação, a Penitência, as Ordens Ministeriais, o Matrimônio e a Unção dos Enfermos.

4. Episcopado histórico – Professamos que a autoridade transmitida por Cristo aos apóstolos e esses aos seus sucessores (incluindo nossos bispos) é, ao mesmo tempo, garantia e expressão da catolicidade e apostolicidade da Igreja.

O ponto central de adoração é a Santa Eucaristia, que é chamada também de Santa Comunhão, Santa Ceia, Ceia do Senhor ou Santa Missa. No oferecimento da oração e do louvor, são relembrados a vida, a morte e a ressureição de Cristo por meio da proclamação da Palavra e da celebração do sacramento. A adoração está no centro do anglicanismo.

MANEIRA DE SER

O ecumenismo faz parte do modo de ser dos anglicanos. Eles oram e trabalham para que as demais igrejas busquem a unidade em amor e obediência a Deus como um só corpo pela ação e poder do Espírito Santo. Os anglicanos acreditam que o trabalho da igreja é pregar o evangelho da reconciliação para o universo inteiro e não só para a parte que se considera cristã.

A Igreja Anglicana busca equilibrar a tradição católica com as influências benéficas da Reforma protestante. Por isso ela é essencialmente católica e também reformada. A liturgia preserva a mais antiga estrutura de culto cristão, com grande ênfase na proclamação da Palavra de Deus. Há um grande valor pela Liturgia, sendo que as crenças e doutrinas são definidas no próprio manual litúrgico (o Livro de Oração Comum).

O LOC orienta as diferentes celebrações cúlticas não segundo uma opinião individual, mas do consenso da Igreja como um todo. É o mais importante livro depois da Bíblia. Sua doutrina estabelece aquilo que acredita serem os verdadeiros valores morais e cristãos. Na sua longa história, a pastoral e a liberdade individual não determinam automaticamente que os seus adeptos têm de fazer isso ou aquilo, mas que para o seu próprio bem devem seguir os ensinamentos da igreja e decidir por si mesmos. É uma igreja que não despreza o uso da razão e da investigação científica. Sua posição liberal e democrática a coloca em posição privilegiada para dialogar ecumenicamente com os demais ramos do cristianismo.

Para glorificação de Deus, além do LOC, a Igreja também dá grande valor à arte sacra, ao altar, arquitetura dos templos e tudo que possa contribuir para expressar nossa fé em Deus: as flores do altar, as cores litúrgicas, velas, incenso, música e a atmosfera de reverência diante de Deus. A Igreja dedica grande respeito aos seus Templos, a ponto de algumas pessoas interpretarem como sinal de frieza o que para nós é expressão de reverência pelo espaço consagrado à oração e culto a Deus.

OUTROS RITOS DE CARÁTER SACRAMENTAL

• Confirmação ou Crisma: Ministrada pelo(a) bispo(a), representa a maioridade na fé e confere a todo confirmado a dignidade do ministério leigo e a plenitude dos dons do Espírito Santo. Para ser confirmada, a pessoa precisa ser batizada, ter aceito Jesus Cristo de forma pessoal e consciente como seu Senhor e receber instrução catequética apropriada.

• Matrimônio: A Igreja Anglicana celebra o matrimônio de acordo com as leis do país e desde que um dos nubentes seja batizado. Os divorciados podem casar-se novamente, cumpridas as determinações canônicas da Igreja.

• Unção e benção da Saúde: Ministrada pelo sacerdote mediante a imposição das mãos a todos que se sentem abatidos física, mental ou espiritualmente. O sacerdote, se julgar conveniente, pode administrar a benção com óleo consagrado pelo(a) bispo(a).

• Penitência: Também conhecida como “Confissão e Absolvição”. Ministrada por um sacerdote coletivamente (durante a liturgia) ou individualmente, assegura o perdão de Deus a todas as pessoas que se arrependerem de suas más ações e desejam reiniciar uma nova vida. “Àqueles a quem vocês perdoarem os pecados, esses serão perdoados” (Jesus em João 20.23).

• Ordenação: A Igreja ordena ao sagrado ministério pessoas que tenham recebido elevada preparação teológica para corresponder à dignidade do ministério. As ordens de diácono, presbítero e bispo são cumulativas, vitalícias e abertas a homens e mulheres solteiros(as) ou cadados(as). Nossa Igreja não exige aos sacerdotes o sacrifício do celibato.

SEXUALIDADE HUMANA

A vida moderna em qualquer parte do mundo vem sofrendo profundas transformações nas últimas décadas, especialmente no campo da sexualidade humana. A Conferência de Lambeth em 1998, que reúne todos os bispos anglicanos a cada dez anos, recomendou que as igrejas anglicanas lutassem contra todas as forças e pressões que destroem a integridade do matrimônio e da vida familiar. Os bispos reunidos em Cantuária lembraram que as congregações locais têm uma grande responsabilidade na preservação da compreensão cristã do matrimônio e da vida familiar. A fidelidade no casamento entre um homem e uma mulher deve durar por toda a vida, embora a abstinência e o celibato sejam um direito daqueles que não se sentem chamados para o casamento.

Sabemos hoje que existem em nossa sociedade muitas pessoas que adotam um comportamento homossexual. Muitas delas são membros da Igreja e buscam uma orientação pastoral e moral da Igreja e o poder transformador de Deus para as suas vidas. Precisamos ouvir essas pessoas e lhes transmitir a certeza de que também são amadas por Deus. Todas as pessoas batizadas, fiéis e obedientes a Deus, não obstante suas orientações sexuais, são membros plenos do Corpo de Cristo, a Igreja.

Mas a conferência dos bispos anglicanos também deixou claro que a prática homossexual é incompatível com os ensinamentos da Bíblia. Por isso, a Igreja não pode legitimar ou abençoar uniões de sexos iguais, ou ordenar ao ministério sagrado pessoas envolvidas em uniões do mesmo gênero sexual.

AIDS

A AIDS não é um problema meramente médico. Ela tem também aspectos éticos e pastorais que geralmente não são abordados pela mídia. Sabemos que a medicina ainda não descobriu sua cura. Por isso, o melhor que podemos fazer é adotar métodos preventivos para, pelo menos, limitar a propagação da doença. A orientação da igreja é no sentido de desenvolver urna ética baseada nos ensinamentos bíblicos, embora sabendo que nem todas as pessoas se comportam segundo os padrões recomendados pela ética cristã. A Igreja Anglicana não considera a AIDS um castigo de Deus sobre o comportamento humano, nem adota uma atitude de condenação da fatídica enfermidade. Ao contrário, procura orientar com programas educativos os aidéticos e seus familiares, que tanto necessitam do apoio pastoral da igreja, para minorar esse sofrimento e enfrentar a morte com mais dignidade. E faz isso da mesma maneira que trata as vítimas de outras doenças terminais. Na verdade, as pessoas hoje precisam revisar seu estilo de vida moral para buscar um comportamento mais sadio e reforçar a fidelidade no casamento e a castidade fora dele, que são meios mais seguros de evitar a terrível doença.

SÍMBOLOS

Um dos símbolos mais conhecidos da igreja anglicana é a Rosa dos Ventos (Compass Rose), espalhado por todos os lugares onde existe uma igreja anglicana, demonstrando que o seu uso está se tornando cada vez mais universal. No centro, vemos a cruz de São Jorge, que lembra a origem dos anglicanos.

A inscrição em grego foi tirada de João 8.32 (a verdade vos libertará) e circunda a cruz e a bússola, lembrando a expansão do Cristianismo anglicano pelo mundo. A mitra que em cima do emblema nos lembra o papel do bispo e a ordem apostólica como elementos essenciais das igrejas que integram a grande família da Comunhão Anglicana. A Rosa dos Ventos é um símbolo largamente usado pelos anglicanos como sinal identificador da Comunhão Anglicana.

A cruz celta, é um símbolo do início do cristianismo nas ilhas britânicas, e hoje , muito associada a fé anglicana. O Círculo em volta da cruz simboliza a universalidade de Cristo, que não tem início nem fim, conforme o livro de Apocalipse: “Eu Sou o Alpha e o Ômega, o princípio e o fim, o primeiro e o último” (Ap 22:13)

 Perguntas e Respostas sobre a Igreja Anglicana

Posso me casar, ser batizado ou crismado nesta Igreja?

Pode! Basta desejar, nós te aceitamos e te recebemos no amor incondicional de Jesus Cristo.

Como a Igreja Anglicana vê os Santos?

Primeiramente não nos esquecemos que a sagrada Escritura é clara ao afirmar: “Jesus é o caminho a verdade e a vida e ninguém vai a Deus senão for por Ele”. Mas nós cremos também que no corpo místico de Jesus Cristo, Deus vinculou todos os seus escolhidos em uma só comunhão e irmandade. Portanto, é saudável buscar imitar, em vida e virtude, os Bem-Aventurados Santos. Nós oramos no Credo que acreditamos na comunhão dos Santos, declaramos então que estamos unidos com todo o povo de Cristo, vivos ou ressurretos lá onde há muitas moradas, segundo Jesus.

Como os Anglicanos vêem Maria?

Eis as palavras do anjo Gabriel e de Isabel, ditas a Maria no Evangelho de Lucas;

“Ave Maria, cheia de Graça, o Senhor é convosco; Bendita sois Vós entre  as mulheres, e bendito o fruto de vosso ventre, Jesus”.

Maria é tida como a favorita entre os Santos, pois quem pode estar mais próximo de Cristo do que aquela que lhe deu a carne, que o carregou, o amamentou, o lavou, o alimentou, o vestiu, o ensinou e que finalmente o segurou morto em seus braços? O próprio Evangelho deixa claro que devemos honrá-la. Quando Isabel diz: ” Tu és a mais Bendita entre todas as mulheres. Por que me está sendo dada a honra de que venha a mim a mãe do meu Senhor?” (Lc I:42-43).

E quando Jesus na cruz entregou Maria para ser a mãe do apóstolo amado, a Igreja sempre entendeu que isso significava que Ele a estava entregando para ser a mãe de todos seus amados discípulos, mãe dos cristãos e mãe da Igreja. Maria não é algum tipo de deusa, e sim, ao contrário, ela foi considerada a mais humilde entre os humildes, mas que obedeceu à vontade de Deus, carregou Seu Filho neste mundo, participou de Seu sofrimento mais do que ninguém e, por isso, agora participa em sua glória. Eis porque o anjo Gabriel previu que todas as gerações a chamariam de Bem-Aventurada, e assim sempre o será.

 

PELA POLÍTICA MELHOR

 Dom Walmor Oliveira de Azevedo

Arcebispo de Belo Horizonte (MG) e Presidente da CNBB

A sociedade brasileira costuma enjaular o diálogo em torno de nomes ao tratar sobre política. As reflexões a respeito de candidaturas constituem capítulo indispensável, especialmente no contexto da política partidária, pois possibilitam realçar nomes com condições adequadas para representar o povo. Mas é importante que essas reflexões sobre candidaturas sejam precedidas e, permanentemente, emolduradas pelo diálogo que promove a política melhor – referência ao título do capítulo quinto da Carta Encíclica Fratelli Tutti do Papa Francisco. Ora, o povo, no cumprimento de sua tarefa cidadã, em conformidade com a Constituição Federal, é o grande protagonista do processo eleitoral, garantia de uma democracia amadurecida. Neste momento em que o País antecipa discussões sobre o processo eleitoral de 2022, priorizando debates sobre nomes que podem ser submetidos ao voto, há de se evitar sério risco: não se investir na recomposição de adequados entendimentos sociais – imprescindíveis para que a sociedade brasileira construa uma política melhor.

 

Quando são consideradas as polarizações sociais e as dificuldades de se elaborar percepções para rumos novos, comprova-se a importância de se promover, massivamente, situações que favoreçam a construção de entendimentos, a partir do diálogo que leva à política melhor. Assim, atende-se a uma necessidade educativa e civilizatória no caminho da recuperação da sociedade, que sofre injunções pesadas – dentre as mais graves, as consequências da pandemia da covid-19, além dos muitos retrocessos que golpeiam a jovem democracia brasileira. Por isso é necessário investir no diálogo que promove a política melhor, uma oportunidade de exercitar a capacidade de ouvir, para adquirir o conhecimento que afasta o contexto político de irracionalidades e manipulações. Esse diálogo qualificado, consequentemente, pode levar a escolhas mais acertadas de nomes submetidos a sufrágios eleitorais. É caminho, pois, para vencer esquemas de corrupção que promovem – e se alimentam – das vergonhosas desigualdades sociais, dos atentados contra o meio ambiente, do desrespeito a direitos, vitimando povos indígenas, dentre outras minorias.

 

A sociedade brasileira, com suas instituições e segmentos, precisa se dedicar à recomposição de sua realidade sociopolítica, o que exige muito investimento. É preciso cuidado para que o País não se envolva, simplesmente, na discussão de nomes, desobrigando-se da tarefa de construir um entendimento civilizatório mais lúcido e abrangente, a ser alcançado com a contribuição da ciência, de estudos e debates. Sem a construção desse entendimento civilizatório, corre-se o risco de empobrecer o processo eleitoral, conferindo-lhe características das disputas entre torcidas no âmbito do esporte. Escolhas políticas jamais podem se estreitar nos parâmetros das simpatias e escolhas esportivas, pois são determinantes na configuração dos rumos de uma sociedade. Se essas escolhas forem equivocadas, consolidam-se práticas irresponsáveis e sem o lastro humanístico necessário para o exercício da liderança que está a serviço do povo, do seu destino e da sua identidade.

 

A história mostra que escolhas equivocadas levam sociedades ao fracasso. Por isso mesmo, é preciso lutar e contribuir para o adequado funcionamento das instituições democráticas e pelo exercício da cidadania – todos reconhecendo seus direitos e deveres. O processo eleitoral deve constituir uma importante oportunidade para o debate social – com o objetivo de consolidar a política melhor. A sociedade depende muito de qualificada politização dos seus cidadãos, que não podem deixar-se aprisionar por polarizações, negacionismos e escolhas parciais. Debates sobre temas e valores constituem desafio para sociedades pluralistas com sérias lacunas humanísticas e carência de princípios morais.

 

O Papa Francisco sublinha a importância da política, partilhando entendimento muito precioso:  a rejeição da corrupção, do mau uso do poder ou da falta de respeito às leis não deve justificar uma economia sem política. A política é imprescindível para lidar com os vários aspectos da crise atual. As lógicas econômicas que escandalosamente favorecem grupos poderosos sacrificando o bem comum, o respeito aos pobres e a preservação da casa comum somente poderão ser superadas a partir de qualificadas lideranças políticas – cidadãos com visão humanística e capacidade para intuir os caminhos do equilíbrio, da garantia da justiça e do bem.

 

Investir agora no diálogo que promove a política melhor permite desenvolver critérios adequados que possibilitem eleger representantes do povo com a competência para ajudar na recomposição da sociedade, promovendo reformas em interlocução com diferentes segmentos. Aos que pretendem se candidatar a cargos nos poderes, é importante lembrar: não é adequado apresentar-se como defensor de alguns princípios, atendendo expectativas de grupos específicos, mesmo com prejuízos a uma política salutar, capaz de reformar instituições, coordená-las e dotá-las de bons procedimentos para a superação de pressões e inércias viciosas. O Papa Francisco, lucidamente, sublinha que o papel da política melhor não pode ser substituído pela economia. Importa muito, agora, mesmo na exiguidade do tempo e considerado o tamanho da demanda, intensamente dialogar sobre a política melhor.